terça-feira, 20 de agosto de 2013

Tolstói rumo ao iPad e ao celular.

Da direta para a esquerda, os Tolstói: Fekla, Caterine, Ekaterina e Vladimir. A família veio ao Rio de Janeiro para participar da 23ª Conferência Geral do Icom Simone Marinho.

RIO - Se tudo sair como planejam os herdeiros do escritor russo Liev Tolstói (1828-1910), que passaram a semana no Rio, até o dia 9 de setembro estarão disponíveis na internet — totalmente de graça e para qualquer uso — os 90 volumes da obra completa do autor. No material, que vem sendo digitado e revisto dia após dia, desde junho, por uma equipe de 3.074 voluntários, estará, por exemplo, a íntegra em russo de obras-primas como “Cossacos” (1863), “Guerra e paz” (1865) e “Anna Karenina” (1878). Mas também estarão textos menos populares, como seus diários. A partir daí, tradutores do mundo todo terão acesso direto à produção do autor. Dos 90 volumes, 78 já estão prontos.

— A ideia é levar Liev para o celular, para o iPad — conta Fekla Tolstói, bisneta do autor e uma das coordenadoras do projeto, reunida com outros três descendentes do escritor numa vila de casas em Copacabana. — Queremos que os jovens deixem de ter medo de folhear obras extensas, que foram escritas há mais de 150 anos. Queremos que eles deem uma chance a Tolstói, porque, se o fizerem, verão que Liev contou histórias incríveis, sentimentos de verdade, que não podem se perder com o passar dos séculos.

Por trás da medida que busca levar Tolstói inteiro à internet e popularizá-lo entre a geração Twitter-Facebook, não há interesse financeiro. E não apenas pelo fato de a obra do escritor, morto em 1910, estar em domínio público. Mesmo antes disso, a família não poderia entrar em disputas por dinheiro. Em seu testamento, escrito em 1883, o autor russo foi claro: determinou que toda sua obra poderia ser copiada e republicada por quem quisesse, em qualquer lugar do planeta, sem a necessidade de pagar diretos autorais a ele ou a sua família.

— Cada (integrante da família) Tolstói tem sua própria profissão — enfatiza o jornalista Vladimir Tolstói, bisneto do autor. — O que Liev fez nos permite ser indivíduos únicos, nos permite crescer para além do fato de sermos descendentes dele. Sem a questão do dinheiro, nos mantemos unidos, em favor da memória de Liev.

‘Novas formas de empacotar o conteúdo’


Os quatro descendentes de Tolstói assumiram a responsabilidade de manter viva a memória do escritor e, além do projeto para internet, cuidam de museus dedicados a seu legado — por isso estiveram no Rio, para participar da 23ª Conferência Geral do Icom, evento que reuniu diretores de museus e curadores do mundo todo, nesta semana, na Cidade das Artes. A esposa de Vladimir, Ekaterina Tolstaya, é a atual dirigente do museu estatal Yasnaya Polyana, considerado o principal ponto turístico em torno da figura de Tolstói.

Situado a 120 quilômetros ao Sul de Moscou, no povoado de Tula, o museu é a casa onde o escritor morou por 60 anos e onde está enterrado. Num passeio pelo local, o visitante conhece os cômodos em que ele viveu, a louça que usou e as roupas que vestiu. Pode apreciar as pinturas e os desenhos que o inspiraram e até dar de cara com o peso de papel que segurou seus rascunhos. Lá, tudo pertenceu a Tolstói. Segundo Ekaterina, a instituição tem orçamento anual de 250 milhões de rublos (cerca de R$ 17 milhões), emprega 600 pessoas e recebe em média 200 mil visitantes por ano.

— O museu foi criado em 1910 por Sofia, a viúva de Liev. Depois, foi dirigido por Alexandra, uma de suas filhas. Em 1921, pouco após a Revolução Russa, mesmo nunca tendo concordado com o comunismo e com os bolcheviques, Alexandra teve que estatizar a instituição. Era uma questão de sobrevivência. Então, até hoje, somos um museu do governo — diz Ekaterina.

— Yasnaya Polyana significa campo ensolarado e é lá que os mais de 130 Tolstói se reúnem a cada dois anos — interrompe, sem pudor, Caterina Tolstói, trineta do autor e representante da geração mais jovem do clã.

Mas, além de Yasnaya Polyana, a família também cuida do Museu Liev Tolstói, que fica em Moscou e tem curadoria de Fekla. O espaço reúne todos os papéis do autor: manuscritos, cartas e diários. Segundo a curadora, seu público é essencialmente composto por pesquisadores.

Hoje, a família Tolstói tem ramificações no governo. Há um ano, Vladimir assumiu o cargo de consultor cultural do presidente Vladimir Putin. Há quatro, preside o comitê russo do Icom. E é partindo do conhecimento que acumulou nesses cargos que diz que, para conseguir apoio, os museus dedicados à memória de um artista devem apostar no envolvimento da sociedade:

— A primeira coisa a se fazer é montar um conselho composto por pessoas das mais diversas áreas que acreditem na importância da conservação. Quanto maior e mais heterogêneo o grupo, maior a pressão sobre o poder público.

— Mas também é fundamental encontrar novas formas de empacotar o mesmo conteúdo — acrescenta Fekla Tolstói. — Para mim, esse é o maior desafio que os herdeiros mundo afora têm pela frente: encontrar um canal de comunicação novo e capaz de falar de forma clara a cada nova geração.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/tolstoi-rumo-ao-ipad-ao-celular-9586168#ixzz2cZ6lI4YT

Fonte: O Globo.

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